Mesmo com todas as incertezas provocadas pela pandemia de corona vírus, o Instituto Clima e Sociedade (iCS) apresentou sua contribuição à Consulta Pública do Leilão de Eficiência Energética que a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) vai realizar em Roraima, mais especificamente em Boa Vista.
No documento protocolado na Aneel, o iCS afirma que o estado de Roraima vive uma situação particular do ponto de vista energético, seja por não estar interligado ao SIN, seja por ser abastecido quase que exclusivamente por fontes térmicas a óleo e poluidoras.
Explica também que o estado sofre frequentes interrupções no fornecimento de eletricidade ou, além de tudo, por restrições ao seu desenvolvimento por não dispor de oferta segura e confiável de energia.
“Assim esta iniciativa, ainda que possa ser considerada modesta, representa um importante sinal para a economia local, possibilitando a disponibilização de capacidade para atendimento ao crescimento da demanda reprimida do estado e possibilitando o aumento da consciência da população para o uso eficiente da energia”, destaca o iCS.
O Instituto reconhece que o Estado reúne as condições ideais para um projeto piloto para, posteriormente, ser levado para o restante do país. No sentido de colaborar para o sucesso do leilão, o iCS apresentou algumas sugestões.
O iCS considera que o potencial de eficiência energética é proporcionalmente elevado, como mostraram os estudos em campo do potencial de eficiência energética feitos em 2018/2019, no âmbito do projeto BCO2R de colaboração do MME/SPE com o iCS.
Somando à necessidade de disponibilidade de energia para o crescimento da economia local, o Instituto propõe elevar o volume a ser contratado no leilão de eficiência energética. “Entendemos que o elevado custo da geração termoelétrica em Boa Vista/ RR representa uma valiosa oportunidade para os recursos não alocados do PEE”, esclarece.
Segundo o iCS, devido ao perfil de consumo e à curva de carga local, sugere-se a inclusão de outras classes de consumo: poder público, serviços públicos, industrial e até mesmo rural, expandindo a área do programa para além da capital Boa Vista, contribuindo assim para o atingimento de uma maior efetividade e atratividade no leilão.
Para assegurar a perenidade das ações durante o prazo de implantação, bem como a atratividade econômica do leilão, o iCS sugere que haja a participação financeira do consumidor nos investimentos, em percentual mínimo a ser definido.
Para o iCS, nos consumidores em que for necessária a troca de medidores antigos por medidores eletrônicos, para medição horária, que esse custo seja arcado pela distribuidora. A modernização do sistema de medição permitirá um maior controle das medidas de Eficiência Energética.
O Instituto Clima e Sociedade avaliou que a adoção dos Contratos de Compra de Energia Elétrica Evitada é desnecessária e não tem utilidade nesse certame, uma vez que a energia evitada não tem como ser contabilizada pelas distribuidoras compradoras. “Embora os mesmos contratos sejam necessários quando o leilão for estendido para alcance nacional ou regional, entendemos que, neste piloto, basta o compromisso contratual de pagamento, proporcional a cada uma das distribuidoras participantes do rateio e da energia economizada”.
O iCS sugere que não seja obrigatório a participação dos interessados através do Agente Redutor de Consumo (ARC) e que qualquer empresa possa se habilitar, através de documentação comprovada e apropriada, a participar do programa, seja consultoria, ESCO, entidade educacional, fabricante ou empresa de engenharia.
Outra sugestão apresentada é a adoção de um prazo maior, tanto para a implementação das ações e projetos, quanto para o programa. Na avaliação do Instituto, seis meses são insuficientes para a implantação do elevado número de projetos a serem implementados e mobilizados. “Da mesma forma, ações como a instalação de micro e mini sistemas em geração distribuída exigem um tempo de retorno superior aos cinco anos, como hoje previsto no programa”.
Por fim, o Instituto Clima e Sociedade avalia como fundamental que recursos do programa sejam usados para uma avaliação independente, não apenas dos resultados efetivos das ações adotadas em termos de M&V, como para a sugestão de melhorias para os futuros leilões, fornecendo subsídios à ANEEL para as análises de impacto regulatório.
Leilões futuros
O iCS aproveitou para dar sugestões quanto aos futuros leilões de eficiência energética e ressaltou que mecanismos de mercado são um instrumento efetivo para a promoção da EE e são adotados em diversos países ao redor do mundo.
O iCS entende que, frente às condicionantes regulatórias, este leilão está sendo realizado com grandes avanços por parte da Agência. “No entanto, para os próximos leilões, o iCS apresenta algumas sugestões do que considera podem ser avanços na direção da promoção da EE”.
Com o avanço do Projeto de Modernização do Setor, representado atualmente pelos PLS 232/2016 e pelo PL 1917/2015, a separação lastro (ou capacidade)/energia pode se concretizar. Além disso, o MME já manifestou a possibilidade da realização de leilões de capacidade. A EE deve participar desses leilões como fonte de capacidade, concorrendo em igualdade de condições com outras fontes de geração.
O iCS explica que o PLS 232/2016 também prevê avanços na separação entre os serviços de conexão e de comercialização de energia (fio – energia). Essa separação daria origem a negócios distintos. As beneficiárias da EE são a sociedade com melhora da intensidade energética, os consumidores com a modicidade decorrente e, também, a distribuidora na operação da infraestrutura de conexão à rede elétrica.
Na extensão dos leilões de EE para outras regiões, sugere o iCS que seria importante que fossem previamente identificados os desenhos de interesse da distribuidora, levando em conta os sinais locacionais e horários para otimização do uso da infraestrutura, diferimento de investimentos em reforço e expansão da rede de distribuição.
Oferta de redução de ponta: esse leilão pode vir a ser realizado por distribuidoras, sob regulamentação da ANEEL, onde consumidores individuais, ou reunidos através de consórcios ou por ESCOs, ofertariam projetos de EE, centrados em redução de ponta em áreas específicas, possibilitando a redução, seja de TUST/MUST, seja de expansão nos sistemas de distribuição.
O iCS argumenta que o uso de parte dos recursos do PEE para constituição de Fundo Garantidor para projetos de EE, reduzindo os riscos e custos de implantação e facilitando o seu financiamento, pois uma das principais barreiras hoje existentes para projetos de EE é o preenchimento de garantias pelas ESCOSs e empresas para os financiadores.
Outra sugestão do ICS é avaliar o impacto regulatório de obrigatoriedade de metas de EE para consumidores e distribuidoras, com emissão de certificados de EE transacionáveis em mercado formado por esses agentes. As metas e o mercado seriam compatíveis, embora não limitados, à aplicação dos recursos do PEE.
Por Nei Costa