O Fórum de Energias Renováveis de Roraima dá continuidade ao debate a respeito da construção da Usina Hidrelétrica do Bem Querer, abrindo espaço para atores de vários segmentos. Na entrevista de hoje, o procurador de Justiça e professor Doutor da Universidade Estadual de Roraima, Edson Damas, fala a respeito dos estudos e levantamentos que fez. Ele vê com preocupação a obra e afirma que todo esse processo deve ser estudado com muita atenção para evitar que outros “elefantes brancos” sejam erguidos com dinheiro público.
Segundo o procurador, os estudos que fez e o conhecimento que tem a respeito da Usina de Bem Querer são advindos das demandas no Ministério Público de Roraima, uma vez que logo depois do anúncio da obra, representantes de povos indígenas da região e de comunidades ribeirinhas que se sentiram ameaçados com a construção da UHE do Bem Querer e demonstraram que eram totalmente contra a obra.
“Inclusive eles listaram alguns impactos diretos sobre seus território, principalmente no que diz respeito à pesca e também à caça. Por isso, essas lideranças indígenas incitaram o Ministério Público para acompanhar esses estudos. Com relação aos benefícios da obra, honestamente eu não vejo nenhum”, adiantou Damas.
O professor lembra que há projetos alternativos aprovados e cita a instalação, no Sul do Estado, da implantação da usina de biomassa na geração de energia. Ele explica que esse projeto já está em execução e que o Linhão de Tucuruí já está em vias de ser liberado, aguardando apenas passar esse momento da pandemia para que haja autorização do povo Waimiri/Atroari para que a obra passe por suas terras.
“Eu tenho acompanhado essa discussão há mais de dois anos e eu penso que não haverá dificuldade nenhuma para a aprovação do linhão de Tucuruí. Então eu não vejo, assim, benefício nenhum para Roraima no que diz respeito à segurança energética do Estado. Temos outras fontes alternativas”, disse.
Edson Damas acredita em há muitos malefícios em relação a construção do Bem Querer. Primeiro, continua, trata-se de uma área turística com grande potencial, de uma beleza paisagística indescritível e isso é protegido por lei. Para ele, haverá problema de legalidade para início da obra, se ocorrer. Outro aspecto levantado, é que será formado um lago muito grande, com pouca geração de energia.
“Então essa é outra questão que tem que ser estudada. Uma área alagada de grandes proporções para pouca geração de energia. Nós temos duas épocas no ano, a das chuvas e de seca, que é mais potencializada. Então vai chegar um período que ninguém sabe se vai suprir as necessidades do Estado. Além do mais, o grande impacto que vai ocorrer sobre o Rio Branco vai interferir diretamente sobre as terras indígenas e comunidades ribeirinhas. Com certeza a dinâmica de vida desses povos será transformada”, define.
O procurador de Justiça lembra outros projetos que ele considera desastrosos como é o caso da Usina de Balbina, no Amazonas. Damas afirma que essa obra ainda é um grande desastre para o território amazônico, pois é uma área alagada imensa com pouquíssima geração de energia. Ele garante que trata-se de um prejuízo imenso para o povo brasileiro e, principalmente para os Wairimi/Atroari, uma vez que parte do seu território foi alagada.
“Inclusive, essa discussão a respeito de Balbina é objeto de uma Ação Civil Pública na Justiça Federal do Amazonas, onde o Ministério Público Federal requer que seja reconhecida a invasão do lago de Balbina sobre o território dos indígenas. Se isso realmente for reconhecido judicialmente, vai gerar um custo muito alto de indenização para União Federal e vai aumentar o prejuízo de todos os brasileiros. “Por isso, nós temos que aprender com isso e não reproduzir esse tipo de projeto na Amazônia”.
Damas afirma que caso o projeto tenha continuidade, as consequências serão imprevisíveis, uma vez que outros empreendimentos executados na Amazônia estão eivados de irregularidades e muitos processos judiciais já estão em andamento;
O procurador cita como exemplo as hidrelétricas de Belo Monte, Santo Antônio e Jirau. Ele explica que são processos internacionais e internos, pois todo o volume de dinheiro gasto está envolto de denúncias de desvios e muitas investigações estão em andamento, inclusive com condenações.
O professor Edson Damas lembra que Roraima tem um alto potencial para energias renováveis, como a eólica, biomassa e solar, mas mesmo assim as autoridades insistem em grandes construções na Amazônia. “Roraima é reconhecido como estado com grande potencial eólico, mas também de energia solar. Hoje o mundo todo está investindo muito nesse tipo de geração de energia limpa e abandonando essas obras de grande porte”.
O procurador e professor universitário, Edson Damas, conclui afirmando que na opinião dele, a obra é totalmente desnecessária. “Estamos na iminência de aprovar a construção do linhão de Tucuruí, temos a construção de novas usinas geradoras, por meio da biomassa, por exemplo, e temos investidores para geração de energia limpa. O Brasil não pode repetir os erros do passado como Balbina, Belo Monte e Santo Antônio e Jirau. Nós devemos explorar as potencialidades do nosso Estado de forma sustentável”, concluiu.
Por Nei Costa