capa-podcast

Artigo: Um leilão para limpar a matriz elétrica da Amazônia  

Na Amazônia, existem 211 sistemas isolados de suprimento de energia elétrica, distribuídos pelos estados do Acre, Amapá, Amazonas, Mato Grosso, Pará, Rondônia e Roraima, com uma carga total de 475 megawatts, atendidos fundamentalmente por termoelétricas a diesel e óleo combustível, cujos custos de geração são extremamente elevados, onerando as contas de energia dos consumidores de todo o Brasil em R$ 8 bilhões ao ano e despejando na atmosfera amazônica cerca de 3,5 milhões de toneladas de CO2 equivalente.

Isso é um escândalo e os brasileiros desconhecem que subsidiam, todos os meses, a geração de energia suja e cara (cerca de 3% a 8% das nossas contas de energias), o que é injustificável em pleno século XXI, diante do desenvolvimento tecnológico de fontes de energias renováveis e limpas, como a solar fotovoltaica e a eólica.

O desafio mais importante das soluções fotovoltaica e eólica é o do armazenamento, para garantir o suprimento de energia à noite e quando não venta; entretanto, as baterias estão ficando cada vez mais baratas e duráveis, impulsionadas pelo boom dos carros elétricos que já começam a dominar o mercado mundial.

É imprescindível e urgente que se estruture política pública de longo prazo de fomento às energias renováveis para que, dentre outras inovações, o subsídio que hoje alimenta a conta CCC, de consumo de combustíveis, comece a migrar para as soluções renováveis e sustentáveis, reduzindo-se ao longo dos próximos anos, em virtude dos baixos custos operacionais e dos ganhos crescentes de produtividade das formas limpas de produzir e guardar energia.

Nesse contexto, o leilão para suprimento de energia, que atenderá 23 localidades em cinco estados da Amazônia, previsto para abril de 2021, com potência total de aproximadamente 52 megawatts, deve ser a oportunidade para implantar projetos demonstrativos da viabilidade tecnológica, econômica e ambiental de soluções híbridas, baseadas nas energias renováveis, integradas ao armazenamento eletroquímico, visando a aceleração da transição energética na Região.

Contudo, as regras estabelecidas pelo Ministério de Minas e Energia (MME), Empresa de Pesquisa Energética (EPE) e Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL) em portarias, instruções e na minuta do edital do Leilão dos Sistemas Isolados 2021 (CP 70/2020) ainda precisam evoluir para incentivar as energias renováveis. Na prática, os prazos curtos de cadastramento, os períodos de suprimento contratual iguais para fontes renováveis e poluentes, e mesmo as dificuldades de registro das soluções híbridas acabam por criar barreiras e, no limite, inviabilizar a participação das soluções renováveis.

É uma situação que não é inteligente nem do ponto de vista econômico, nem ecológico, além de deixar de atender aos melhores interesses da sociedade e do país, desestimulando o desenvolvimento de importantes setores da indústria brasileira.

Ainda dá tempo para evitar esse erro estratégico e alinhar-se com a tendência mundial de governos e do mercado, “apressando o futuro” a partir de uma matriz elétrica mais limpa na Amazônia, numa demonstração clara de vontade política do Governo Brasileiro em favor da população e do meio ambiente da Região, de todos os consumidores brasileiros e da indústria nacional.


AN AUCTION TO CLEAN UP THE ENERGY MATRIX OF THE AMAZON

In the Amazon, there are 211 isolated electricity supply systems, distributed by the states of Acre, Amapá, Amazonas, Mato Grosso, Pará, Rondônia and Roraima, with a total load of 475 MW. They are mainly served by diesel and fuel oil thermoelectrics, whose production costs are extremely high, charging the energy bills of consumers throughout Brazil by R$8 billion a year and dumping into the Amazon atmosphere about 3.5 million tons of CO2 equivalent.

That is a scandal and Brazilians are unaware that they subsidize, every month, the production of dirty and expensive energy (about 3% to 8% of our energy bills), which is unjustifiable in the 21st century, in the face of the technological development of renewable and clean energy sources, such as photovoltaic solar and wind energy.

The most important challenge of photovoltaic and wind solutions is that of storage, to ensure the supply of energy at night and when there isn’t wind. However, batteries are getting cheaper and more durable, driven by the boom in electric cars that have already begun dominating the world market.

It is essential and urgent that a long-term public policy to promote renewable energies be structured so that, among other innovations, the subsidy that now feeds the fuel consumption bill, begins to migrate to renewable and sustainable solutions, reducing over the next few years, due to low operating costs and increased productivity gains from clean ways of producing and storing energy.

In this context, the public auction for eletricity supply, which will serve 23 locations in 5 states of the Amazon, scheduled for April 2021, with a total power of approximately 52MW, should be the opportunity to implement projects demonstrating the technological, economic and environmental feasibility of hybrid solutions, based on renewable energies, integrated to electrochemical storage, aimed at accelerating the energy transition in the region.

However, the rules established by Brazilian national agencies (MME, EPE and ANEEL) in ordinances, instructions and in the draft notice of the Auction of Isolated Systems 2021 (CP 70/2020) still need to evolve to encourage renewable energies. In practice, the short registration deadlines, the equal contractual supply periods for renewable and polluting sources, and even the difficulties of registering hybrid solutions end up creating barriers and making participation of renewable solutions, in the end, impossible.

It is a situation that is not intelligent from an economic or an ecological point of view, besides failing to meet the best interests of society and the country, discouraging the development of important sectors of Brazilian industry.

There is still time to avoid this strategic error and become aligned with the global trend of governments and the market, “rushing the future” from a cleaner energy matrix in the Amazon, in a clear demonstration of the political will of the Brazilian government in favor of the population and the environment of the region, of all Brazilian consumers and the national industry.

Por Alexandre Henklain – Coordenador do Fórum de Energias Renováveis; Carlos Brandão – Presidente da Associação Brasileira de Armazenamento e Qualidade de Energia; Donato da Silva Filho – Diretor da Volt Robotics.