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Diocese de Roraima promove Ciranda Virtual a respeito da construção da UHE do Bem Querer

No final da tarde desta segunda-feira (10), a Diocese de Roraima promoveu uma Ciranda Virtual para discutir os impactos que poderão ser gerados pela Usina Hidrelétrica do Bem Querer. Participaram do encontro Yuri Paulino, da Coordenação Nacional do Movimento dos Atingidos por Barragens e o biólogo Ciro Campos, representando o Movimento Puraké. A Ciranda foi mediada pela Irmã Telma Lage, coordenadora do Centro de Migrações e Direitos Humanos da Diocese.

Os participantes da Ciranda foram unânimes em afirmar que há muito o quê se discutir sobre o empreendimento e que o governo federal, por meio das empresas responsáveis pelo projeto e pelo licenciamento ambiental devem ser mais transparentes, colocando à disposição as informações sobre os impactos que podem ser gerados com a construção da UHE.

Ciro Campos começou afirmando que o Rio Branco faz as pessoas pensarem sempre vida, “em vida plena e vida com abundância”. Ele lembrou que representa um Movimento que sempre lutou pela disseminação da informação para que a sociedade possa conhecer o projeto decidir por conta própria se é ou não é bom para o Estado como um todo.

Yuri Paulino disse que compartilhar ideias abrangentes sobre o tema é de suma importância para tentar fazer com que o Rio Branco continue correndo livre e diferente de outros rios que hoje já não têm essa chance, “pois foram tomados pela ganância e violência do capital”.

Yuri lembrou que o Movimento que representa existe há 30 anos e como diz o nome, a sua origem é de trabalhadores que foram expulsos de suas terras pela construção de barragens, especialmente hidrelétricas para produzir energia em todo o Brasil. Ele explicou que as hidrelétricas no Brasil, em sua essência, são estruturas feitas nos rios com muros e paredes para produzir energia de forma mecânica.

“Tecnicamente a hidrelétrica seria isso, mas do ponto de vista social do ponto de vista ambiental a hidrelétrica é um conjunto de outras coisas que não podem ser olhadas apenas como uma estrutura de engenharia que represa água, gera um movimento que gera energia para atender as demandas. Do ponto de vista social e ambiental a hidrelétrica é um conjunto de outros fatores que a gente precisa debate e fazer com que a sociedade entenda o que é”, disse Yuri.

Ciro Campos lembrou que o projeto do Bem Querer, por enquanto, é só um projeto e trata-se de uma usina de grande porte, hoje a maior usina planejada para Amazônia. “Uma barragem de aproximadamente 10 km de extensão com quase 20 m de altura que seria construída bem próxima da sede do município de Caracaraí e formaria um lago de mais de 50 mil hectares ou cerca de 520 quilômetros quadrados. Esse lago começaria em Caracaraí e terminaria após Boa Vista. Essa é a diferença fundamental em termos de Meio Ambiente. Você transformaria um trecho de aproximadamente 135 km de rio com água corrente e um trecho de água parada. Do ponto de vista social e econômico é uma obra que pode trazer mudanças bem intensas e profundas e sem precedentes”.

Outro fator que foi lembrado pelos dois participantes da Ciranda é que no pico da obra poderiam ser gerados cinco mil empregados. O problema, segundo ele, é que há exemplos de outras usinas hidrelétricas da Amazônia, onde se disponibilizaram um número de vagas de emprego, mas o número de pessoas que fluíram para a obra foi bem maior.

Eles afirmam que esse tipo de impacto não é reconhecido e nem esclarecido pelo governo federal. Ciro e Yuri lembraram que no caso da hidrelétrica de Belo Monte havia uma oferta de emprego de pouco mais de 20 mil pessoas, mas a obra atraiu quase 100 mil. Isso gerou um impacto de proporções gigantes, pois a estrutura urbana de Altamira, não estava e nem foi preparada para receber um volume tão grande pessoas.

De acordo com Ciro e com Yuri, houve uma sobrecarga e os serviços essenciais como saúde, educação e segurança não tiveram condições de atender a demanda e o que causou um grande impacto social, gerando violência, doenças e índices enormes de pessoas sem acesso à educação.

Ciro Campos explicou que a usina promete fornecer energia para o Estado de Roraima, mas principalmente para atender ao Sistema Interligado Nacional. “Isso significa que é uma obra para atender o Brasil como um todo, mas quem paga o preço são as pessoas que vivem em Roraima”, destacou o biólogo.

Para o representante do Movimento Puraké, a obra promete agregar pouco para a indústria e para o comércio locais de Roraima, pois as compras normalmente são de grande proporção que sempre beneficiarão grandes empresas de outros estados no Brasil. “Então, até mesmo do ponto de vista do emprego a gente acredita que ela é uma obra que vai apresentar poucos benefícios”.

Já Yuri Paulino lembrou que todos os grandes projetos que são discutidos na Amazônia, como mineração e abertura de estradas, “são carregados de muitas mentiras no sentido de enganar o povo com a promessa que vai trazer desenvolvimento, emprego e no caso das hidrelétricas que vai trazer a energia e qualidade de vida. Tudo isso é só mentira”.

Ciro Campos chamou a atenção para uma questão que ele considera muito importante, que diz respeito às alternativas. “O governo diz que os estudos estão disponibilizados para todos, mas o estudo de alternativas trata-se do seguinte: “uma alternativa é para que essa hidrelétrica seja um pouquinho mais para esquerda ou um pouquinho mais para direita. Essa hidrelétrica vai ser desse jeito ou daquele. Não é um estudo de alternativas à construção da hidrelétrica. Essa é uma questão que nós estamos discutindo agora no Fórum de Energias Renováveis de Roraima, que é a necessidade de pressionar o governo para que se faça esse estudo de alternativas ou que disponibilize todas as informações para que nós, da sociedade civil, nos juntemos para analisar quais as melhores”, cobrou Ciro.

Yuri e Ciro lembraram que em Roraima há alternativas para geração de energia e citaram como exemplo o sol, o vento, a biomassa e até a agroenergia. Para eles, o custo da obra da UHE do Bem Querer é muito alto e que com o volume de dinheiro que será gasto nela, daria para fazer investimentos em outras fontes e ainda promover o desenvolvimento social sem gerar tantos problemas.

Ambos afirmaram que com a proximidade das eleições é necessário que os políticos entrem nesse debate. “Eles querem fazer o espetáculo, a promessa de desenvolvimento e anunciar grandes obras. É onde os demagogos se criam, prometendo coisas para o povo que não vão resolver os problemas tão importantes. Por isso, as pessoas devem ficar atentas, pois a tendência são eles se aproveitarem disso para tentar enganar o povo”, chamou a atenção Yuri.

Por Nei Costa